Crítica Kaos S1: deuses gregos em série interessante

Para quem é bombardeado diariamente com a mitologia cristã, ainda tida por muitos como real — olá, católicos e evangélicos —, é interessante revisitar histórias de outros deuses de vez em quando.

É isso que faz a série Kaos, da Netflix, que dá uma nova roupagem à mitologia grega e conta a história da queda do deus que reina superior aos outros deuses, Zeus, interpretado por Jeff Goldblum.

Com bonitas locações se concentrando principalmente na Espanha, a produção tem um humor mais visceral, algo já familiar a Charlie Covell, pessoa não binária que criou esta atração e escreveu o roteiro de The End of the F***ing World.

Em um universo de séries inúmeras vezes repetitivas, é importante ressaltar que Kaos se destaca principalmente por não parecer mais do mesmo. É um trabalho interessante.

A partir da narração de Prometheus (Stephen Dillane), personagem que é uma das tantas vítimas da tempestuosidade de Zeus, conseguimos entender bem uma trama que tem muitas peças sendo movidas com um único propósito: a confirmação de uma profecia.

Não que a condução geral da série seja perfeita. Eu, particularmente, preferiria um tom mais sombrio à história — fazendo assim com que ela pudesse rivalizar com Game of Thrones no quesito de narrativas fantásticas que nos deixam boquiabertos com cada reviravolta.

A pegada mais cômica de Kaos ajuda a diluir o choque de partes como incesto e morte. Entretanto, ao mesmo tempo, tira o caráter épico do enredo. Aliás, toda a trama do mundo dos mortos, em preto e branco, tem uma beleza e uma dramaticidade digna que produções que se levam mais a sério.

De qualquer forma, a série funciona e tem muitos méritos. Um bom exemplo é o arco de Caeneus (Misia Butler). Interpretado por um homem trans, o personagem também trans ganha um passado melhor do que aquele da mitologia original, no qual uma mulher é sexualmente violentada por Poseidon e pede para ser transformada em um homem impenetrável para que isso nunca mais ocorra.

Esse pequeno trecho nos faz refletir sobre várias coisas, como a crueldade constantemente vista na mitologia grega; a vulnerabilidade histórica de corpos lidos como femininos; e a existência milenar de pessoas trans, a despeito do discurso corrente de reacionários que quer fazer acreditar que identidades queer são uma invenção moderna da esquerda.

Por sinal, de forma mais abrangente, uma das partes mais legais de acompanhar Kaos é querer entender a história original dos personagens, comparar trajetórias, ponderar que adaptações foram interessantes para a produção televisiva.

O que faltou, todavia, foi o grande conflito com Zeus de fato. O fim da primeira temporada deixa tudo preparado para a derrocada do deus. Como os filósofos bem dizem, agora é o momento do tiro, porrada e bomba. Se for para cair, que seja atirando.

Que tenhamos logo um segundo ano ainda mais doido, mais queer, mais fantástico.

Nota (0-10): 7

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Uma resposta para “Crítica Kaos S1: deuses gregos em série interessante”.

  1. Avatar de Ana Coimbra
    Ana Coimbra

    Série leve e muito bem conseguida.

    Quem assenta as sua criticas na comparação da mitologia grega é tonto. Trata-se de uma obra de ficção e adaptação livre que tem por base essa mesma mitologia. Não um documentário.

    Adorei!!!!!!

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